Salões Oficiais de 1881 e 1882
Neste último texto que traduzimos em nosso blog acerca da crítica de Huysmans sobre Manet, o escritor aponta certa habilidade de execução em Folies-bergère, tela exposta no salão de 1882 e reproduzida em nosso Manet no Rio. Porém, os dois retratos expostos no salão de 1881 — o do jornalista Henri Rochefort e o do caçador de leões Pertuiset — não escaparam do julgamento severo, apesar de debochado e imagético, de Huysmans.
Salão Oficial de 1881
Este é definitivamente um ano ruim, pois eis que chegou a vez de o senhor Manet desmoronar. Como um vinho verde um pouco áspero, mas de sabor peculiar e limpo, a pintura desse artista era envolvente e estimulante. Ei-la agora sofisticada, carregada de fucsina, esvaziada de todo tanino e de toda flor. Seu Retrato de Rochefort [Retrato do jornalista Henri Rochefort], feito a partir das práticas semi-oficiais, não se sustenta. Ele se assemelha àquelas carnes, ao requeijão com ervas, manchado por bicadas; e aqueles cabelos se parecem com uma fumaça cinzenta. Não há tom, não há vida; a delicadeza nervosa daquela fisionomia inédita não foi minimamente compreendida pelo senhor Manet.
Quanto ao seu Pertuiset [Retrato do senhor Pertuiset, caçador de leões], ele aponta, ajoelhado, seu fuzil na sala, onde com certeza vê animais selvagens, ao passo que uma espécie de manequim de leão amarelado está deitado atrás dele, debaixo das árvores; realmente, não sei o que dizer. A pose desse caçador de costeletas, que tem ares de quem mata coelhos nos bosques de Cucufa, é infantil, e, em termos de execução, essa tela não é superior àquela cercada por tristes aves de rapina. Para distingui-las, calhou de o senhor Manet dar-se ao trabalho de revestir a sua terra de violeta; não é lá das mais interessantes inovações, além de ser demasiado fácil.
Sinto-me profundamente contrito por ter sido obrigado a criticar tão duramente o senhor Manet, mas dada a absoluta sinceridade que demonstrei até agora nesta série de salões, eu tinha, comigo mesmo, o dever de não mentir e de não esconder, por partidarismo, minha opinião sobre a obra exposta desse pintor.
Salão de 1882 – Apêndice II
O Bar das Folies-bergères, do senhor Manet, deixa os espectadores que se aglomeram ao redor da miragem desta tela estupefatos, enquanto trocam observações desorientadas entre si.
Em nossa frente, está de pé uma grande moça de vestido azul, com decote à mostra, de ventre cortado por um balcão sobre o qual se amontoam garrafas de vinho de Champanhe, frascos de licor, laranjas, flores e copos. Atrás dela, está estendido um espelho que nos mostra, ao mesmo tempo que as costas refletidas da mulher, um senhor visto de frente a conversar com ela; mais adiante, atrás — ou melhor, ao lado desse casal cuja ótica é de relativa exatidão —, percebemos todo o perímetro das Folies, e, num canto, acima, as botinas verde-uva da acrobata em pé no seu trapézio.
O tema é muito moderno, e a ideia que o senhor Manet teve de assim dispor sua figura feminina, em seu meio, é engenhosa; mas o que significa essa iluminação?
Aquilo, à luz de lampião e à luz elétrica? Ah, vá, é um vago céu aberto, um banho de luz pálida diurna! — já aí, tudo desmorona — As Folies-bergère só existem e só podem existir à noite; se compreendidas e se sofisticadas dessa maneira, elas são absurdas. É realmente deplorável ver um homem de valor como o senhor Manet sacrificar-se a tais subterfúgios e, em suma, pintar quadros tão convencionais quanto os dos outros!
Lamento ainda mais o fato de, apesar dos tons de gesso, o bar estar repleto de qualidades, de a mulher estar bem posicionada, de a multidão vibrar intensamente com vida. Apesar de tudo, este bar é certamente o quadro mais moderno, o mais interessante dentre todos nesse Salão. Também apontarei um retrato de uma mulher, todo encantador, no qual o óleo absorve as suavidades do pastel, no qual a carne é de uma penugem, de uma deliciosa floração de cor.
Tradução: Régis Mikail
Preparação: Thiago Abercio
Imagem principal: Portrait de M. Pertuiset, le chasseur de lions, Édouard Manet, 1881 (wikipedia.org)
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