O que foi dito na época sobre “A Menina que não fui”: três textos críticos
Reproduzimos aqui no blog da Ercolano três resenhas de escritores proeminentes sobre La Fille manquée (1903), publicadas naquele mesmo ano.
A primeira crítica consiste em uma carta de Rémy de Gourmont (1858-1915) endereçada a Han Ryner. Prolífico e recluso, Rémy de Gourmont foi um escritor emblemático do simbolismo francês entre o final do século XIX e o início do século XX. Sua obra consiste em ficções, estudos sobre religião e a contemporaneidade.
Em sua avaliação de La Fille manquée, Gourmont recorre a termos científicos vigentes na época, como “patologia” e “psicologia mórbida”. Em termos mornos, ele afirma que o tema de La Fille manquée, embora não seja novidade, é digno de ser tratado na arte. Gourmont chega a denunciar a hipocrisia de seus contemporâneos, ainda que tenha mencionado termos do campo da religiosidade e da moral, como “vício” e “Sodoma”.
De maneira pouco entusiasmada para com La Fille manquée de Ryner, ele afirma que esse texto não seria exatamente um romance, mas sobretudo uma espécie de ensaio sobre psicologia.
Leia a carta de Rémy de Gourmont
Rachilde, escritora também prolífica e autora de romances originais sob o pseudônimo de Marguerite Eymery (1860-1953), é conhecida por seus pontos de vista originais sobre feminismo e sexualidade. Em sua prosa inovadora e mordaz, a mulher é protagonista. Suas (anti-)heroínas deixam os homens perplexos com suas maneiras de lidarem — e de absorverem, ironicamente, — estereótipos masculinos. (Aliás, a Ercolano publicará no ano que vem alguns romances dessa escritora pouco traduzida em português.)
A respeito de La Fille manquée, ela tece críticas um tanto ou quanto irônicas à verossimilhança do enredo. Faz, ainda, certas insinuações sobre o personagem François e o próprio Ryner. Sua conclusão é semelhante à de Gourmont: um caso clínico. Tudo que sai da cabeça da “mulherzinha” remeteria à anormalidade. Assim como Gourmont, Rachilde considera desnecessárias as passagens sobre os “amores” e “carícias” de François, longas demais, segundo ela.
Paul Réboux (1877-1963) foi romancista, jornalista, pintor e humorista. Sua obra mais conhecida são os três volumes intitulados À la manière de… [“À maneira de…”] nos quais faz pastiches com a prosa e o estilo de escritores famosos.
Sua opinião sobre o romance de Ryner é a mais condescendente das três, louvando a audácia de Ryner em abordar o tema em tempos de literatura burguesa “água-com-açúcar”.
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